Perda Auditiva: O Phonak Insight do mês de janeiro de 2018 nos trouxe um artigo muito importante intitulado: “As orelhas são a porta para o cérebro” escrito pela Dra Carol Flexer da Universidade de Akron em Ohio (EUA). As informações são extremamente importantes para as famílias que estão iniciando o processo de reabilitação auditiva e, portanto, achei fundamental compartilhar:
A autora reflete sobre a mudança das nossas preocupações. Apesar de ser importante conhecermos como funciona a orelha interna, cóclea e nervo, a nossa maior preocupação atual é a “percepção cerebral da informação auditiva”.
O gerenciamento da audição mudou para um novo nível, pois agora reconhecemos o cérebro como o ponto final do processo de audição. Para que a mensagem linguística significativa seja construída, precisamos que muitas áreas do cérebro participem e reajam ativamente. Portanto, fica claro que a perda auditiva leva prejuízo não apenas para as orelhas.
Os profissionais envolvidos no tratamento de crianças com perda auditiva, precisam unir conhecimentos sobre a perda auditiva, privação neuronal, plasticidade cerebral e desenvolvimento da alfabetização e estar preparados para explicar estes conceitos e conexões para os familiares.
Da mesma forma que a percepção dos cheiros e a compreensão da informação visual ocorre no cérebro, a escuta dos sons também é uma atividade cerebral. Portanto a perda auditiva é primeiramente uma questão cerebral e não apenas uma questão envolvendo o órgão auditivo.
A perda auditiva é uma obstrução de uma porta de entrada para o cérebro e pode obstruir esta passagem de diferentes maneiras e graus, desde pequena até total obstrução. É através da porta auditiva que a criança vai desenvolver fala, escrita, aprender conceitos e desenvolver relações sociais. Felizmente, as tecnologias auditivas tem sido uma arma para transpor estes obstáculos.
As tecnologias auditivas (como aparelhos auditivos, implantes cocleares, dispositivos ancorados no osso e sistemas de microfones remotos) são projetadas para desobstruir a porta de acesso ao cérebro e permitir a ativação, estimulação e desenvolvimento de vias neurais auditivas com informações auditivas, incluindo linguagem falada. As tecnologias auditivas vão entregar a informação auditiva para o cérebro. Portanto, o uso destes dispositivos deve ser o mais precoce e contínuo possível.
Com a entrega da informação auditiva pelas tecnologias auditivas ao cérebro, este cérebro precisa ser estimulado e enriquecido com conhecimento. Portanto, a adaptação de um aparelho auditivo é apenas o primeiro passo para o desenvolvimento da rede neural da criança. “A criança então deve usar o dispositivo pelo menos 10 horas por dia e ser imerso em um ambiente rico em linguagem familiar, através do treinamento por um profissional de audição e linguagem falada (McCreery et al., 2015)”. Os membros da família devem ser encorajados a falar, ler e a enriquecer com a língua materna o mundo auditivo da criança.
A neuroplasticidade refere-se à disponibilidade e maleabilidade do cérebro para crescer, desenvolver e alterar sua estrutura como função da estimulação externa (Chermak, Bellis & Musie, 2014, Kilgard, Vasquez, Engineer e Pandya, 2007). A neuroplasticidade é maior durante os primeiros três anos e meio de vida (Sharma, Campbell & Cardon, 2015). Quanto mais jovem a criança, mais neuroplasticidade o cérebro tem (Kral, 2013).
O crescimento rápido do cérebro infantil requer intervenção rápida, tipicamente incluindo amplificação e/ou implantação coclear e um programa abrangente de intervenção para promover o desenvolvimento de habilidades auditivas. Se a informação auditiva clara e intacta for recebida, então é assim que o cérebro será organizado. Por outro lado, se a perda de audição não gerenciada filtra alguns ou todos os sons de fala de atingir os centros auditivos do cérebro, o cérebro será organizado de forma diferente e experimentará a falta de informações auditivas necessárias (Kral et al., 2016).
As investigações científicas básicas mostram que quando o cérebro não tem acesso a fala inteligível durante os primeiros anos da vida de uma criança, o atributo auditivo significativo não coordena a atividade entre o córtex auditivo primário e secundário (Kral et al., 2016). Além disso, o estímulo auditivo além do período crítico do desenvolvimento da linguagem encontra conexões funcionais desordenadas e interações entre o córtex auditivo primário e secundário, complicando ainda mais o aprendizado auditivo (Kral e Lenarz, 2015). A desconexão entre o córtex auditivo primário e secundário tem implicações funcionais significativas para o desenvolvimento da linguagem auditiva e oral. Quando os sinais auditivos não são efetivamente e transmitidos do córtex auditivo primário para o secundário, o córtex auditivo secundário não pode distribuir a linguagem falada e outros sons e informações significativas para o resto do cérebro para criar significado auditivo e conhecimento.
Se a porta de entrada de estímulos auditivos permanence fechada, levando a privação auditiva, todas as conexões não são realizadas e essa limitação da experiência auditiva afeta o funcionamento neurocognitivo que vai muito além da linguagem falada.
Crianças ouvintes tem as portas do ouvido abertas 24 horas por dia. Infelizmente crianças com perdas auditivas “abrem” suas portas apenas nas horas que estão usando os dispositivos auditivos, e infelizmente nenhum deles foi pensado para ser usado 24 horas por dia. O cérebro foi organicamente designado para receber estimulação auditiva continua, mesmo enquanto dormimos. Se pensarmos que uma criança ouvinte com 1 ano de idade já tem 16 meses de audição (considerando a estimulação auditiva intra-utero), e que apenas neste momento esta apta para produzir as primeiras palavras, podemos concluir que este “tempo auditivo” é fundamental para que o cérebro tenha acesso aos inputs auditivos necessários ao desenvolvimento.
O enriquecimento cerebral é uma necessidade. Ao contrário de qualquer outro órgão, o cérebro não está totalmente desenvolvido quando uma criança nasce; O desenvolvimento do cérebro é completamente dependente da experiência ambiental (Kral & Lenarz, 2015; Suskind, 2015). Então, por isso, nos primeiros três anos de vida, a base para todo o pensamento e aprendizagem está sendo construída através da conversa e da interação dos pais (Caskey et al., 2011; Cole & Flexer, 2016).
Como a linguagem/informação é aprendida melhor na interação social e na conversa com as pessoas que amam a criança, os pais tem papel fundamental neste aprendizado e devem ser estimulados a aumentar o conhecimento do cérebro de seus filhos diariamente.
Em caso de dúvida, consulte um especialista.
“As informações aqui colocadas são de caráter informativo. Cada paciente possui suas particularidades e deve ser avaliado e tratado de forma individualizada. Se você tem algum problema de saúde, procure um médico especialista.”
Fga Dra Elaine Soares
CRFª 2-8024